Terra, recursos naturais e violência em África

Terra, recursos naturais e violência em África

A questão da terra em África e noutros lugares está intimamente ligada a questões de cidadania, identidade, e a noção de comunidade política. Sugerir que a terra é uma das questões mais politizadas em África é um eufemismo. Nas últimas décadas, a gestão da terra e os sistemas de distribuição, acesso e controlo da terra tornaram-se cada vez mais desligados do seu significado social e cultural mais amplo e deram lugar ao extrativismo e à mercantilização. Como consequência, os conflitos de terra e recursos naturais aumentaram, juntamente com o aumento de insurgências violentas, terrorismo e radicalismo. Isto tem sido particularmente evidente em Moçambique, no Sudão, República Democrática do Congo, Níger, Nigéria, entre outros.

Em muitas partes de África, o fim formal do colonialismo e o advento da independência nacional nem sempre se traduziu num projecto nacional no que diz respeito à política de terras como instrumento de inclusão. A capacidade dos Estados africanos para articular um quadro estratégico ou coerente de política fundiária foi rapidamente frustrada pelo aprofundamento do neoliberalismo, a austeridade, a erosão do domínio estatal, a desintegração regional e nacional, e os conflitos sociais e políticos que, em alguns casos, conduzem à violência.

Em geral, os projectos de unidade nacional são fortemente contestados e os processos modernos de integração regional não parecem servir o propósito para o qual foram criados. Paralelamente, a ideia de Estado-nação é constantemente contestada e os Estados estão a perder legitimidade.

Esta série de duas conferências/ mesas redondas visa reflectir sobre estas e outras questões. Tomará como ponto de partida a questão da terra para abrir um debate sobre a apropriação do conhecimento e dos recursos naturais no continente africano, e o seu impacto na exploração dos casos actuais de Moçambique (insurgência armada e terrorismo), Angola (extrativismo de exclusão e captura das elites) e Níger (captura corporativa de recursos) como ponto de entrada para responder, mas não se limitar, às seguintes questões:

1) Quais são as marcas dos regimes coloniais e raciais de propriedade nas formações jurídicas modernas em toda a África?

2) Como tem vindo a consolidar-se a relação íntima entre a terra como propriedade e o Estado moderno em todo o continente?

3) O que está a impulsionar a apropriação privada e acumulação de terras e recursos naturais no continente africano e como pode a promoção de uma noção de bens comuns (commons) desempenhar um papel na inversão da mercantilização da terra?

4) Como podemos repensar as políticas redistributivas e centradas na terra e nos recursos naturais, e como podemos repensar a nação e o espaço público para encontrar caminhos para políticas e acções inclusivas que reduzam a violência baseada na terra? Isto inclui levar em conta as questões de género, etnia e geração.

5) Em contextos moldados pela pluralidade jurídica, como dar conta de uma variedade de abordagens na resolução de conflitos de terra e de recursos e no aprofundamento da democracia em África?

6) Como é que as lutas pela terra e pelo ambiente em África contribuem para um reconhecimento mais profundo de múltiplas subjectividades, agências e práticas? Pode esta multiplicidade de experiências contribuir para uma renovação democrática?

Moderação : Dr. Maria Paula Meneses (Universidade de Coimbra).

Oradores(as): Dr. Nisrin Elamin (Bryn Mawr), Dr. Ricardo Cardoso Raboco (Universidade de Licungo), Dr. Liazzat Bonate (Universidade de West Indies), Dr. Fodé Abulai Mané (Faculdade de Direito de Bissau), Dr. Raul Mendes Fernandes (Universidade Amilcar Cabral).